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    1590 Jornal A Bigorna 20/06/2021 12:00:00

    Palanque do Zé

    Dia 31 de maio de 2021 foi estranho. Por volta das 11:30 a moça do laboratório me disse ao telefone:

    - Alô? Senhor José?

    - Pois não?

    - Aqui é do laboratório. Estou ligando pra dizer que o seu exame deu positivo.

    - ..............

    - Senhor José?

    - Eu já esperava.

    - Já?

    - Já.

    Sim, eu já esperava. Quatro dias antes, logo depois do almoço lá no Escritório, eu senti uma moleza, mas que passou rápido. No dia seguinte, a mesma coisa. Até reclamei para o meu Pai, mas ficou por isso mesmo.

     Dois dias depois, durante a madrugada tive uma desinteria e aí a luz amarela se acendeu. Talvez eu estivesse com COVID-19. Minha Esposa também ficou alerta, mas nada disse.

    Fui dormir pensando nisso e acordei com a pior dor de cabeça que eu já havia sentido. A sorte que durou pouco.

    Liguei para o Dr. Cláudio Nardinelli, o médico da família, e sua primeira resposta aos meus reclames foi:

    - Nossa, Zé...

    Assim que desliguei o telefone, falei com minha Esposa e decidi sair de casa, já que ela ainda não foi vacinada e poderia se contaminar nas horas que fosse me ajudar com a higiene pessoal.

    Liguei para os meus pais e combinamos de fazer a recuperação na casa deles. Meu Pai se mudou temporariamente para um outro imóvel que a gente tem e ficou atuando como nosso elo com o mundo exterior.

    Minha Mãe ficou comigo por ser a mais saudável e a única já completamente vacinada.

    Não fosse isso, estaríamos em apuros, pois eu a infectei no segundo dia de quarentena. E a única coisa que ela precisou foi de uma única dose de Dipirona. Mamãe nunca falha. Com isso aprendemos, na prática, que vacinas salvam vidas. Ela foi contaminada, mas não passou nem perto de sentir o que eu senti.

    E o que eu senti foi a versão mais fraca da COVID-19. Tive todos os sintomas, menos falta de ar e perda do paladar e do olfato.

    Do chamado dia 1 ao 7, tudo o que senti foi absolutamente fraco e contornável. Tanto que, de portas fechadas e sem atender ninguém, trabalhei normalmente.

    Os meus dias ruins foram o 8, 9 e 10. Tive muita febre, ânsia de vômito, tontura e sonolência. Ao final desse período, me sentia como se um elefante tivesse me mascado feito chiclete e depois cuspido fora.

    Foi nesses dias que eu temi a morte. Com um certo exagero, cheguei a achar que em breve eu seria mais um velho cara a ser lembrado.

    Não foi fácil. Tanto que precisei pedir licença da Presidência do Rotary Club de Avaré e abrir mão de alguns processos no Escritório.

    Nos dias 11 e 12 eu tive que lidar com os efeitos adversos dos remédios milagrosos que o Dr. Valmir Kuniyoshi ministrou: Sonolência, perda de capacidade de concentração e tontura. Dormi o dia todo e passou.

    No 13º dia eu consegui – ainda de portas fechadas e em quarentena – trabalhar.

    Do 14º até o 21º dia, quando deixei o isolamento, nada de muito interessante aconteceu, exceto que fui refazer os exames com minha Mãe e ambos fomos declarados como curados, sendo incapazes de transmitir COVID-19 para quem quer que seja.

    Aliás, tão logo eu descobri a doença, tratei de avisar as pessoas com quem havia estado e também todos os Clientes do Escritório, para que não viessem me ver. Acho que esse é o mínimo que se pode fazer.

    A pergunta que mais ouvi foi: Mas como você pegou? E a resposta é constrangedoramente simples: Não sei. Se soubesse, não tinha pego.

    Eu uso máscara, muito álcool em gel e evito aglomerações. Não estive com ninguém que estava com sinais de portar a COVID-19 ou algo do tipo.

    E isso só prova uma coisa, que para mim sempre foi óbvia: Não é como se você pudesse evitar lugares ou pessoas e tudo bem. As coisas não são tão simples.

    Inúmeros fatores têm que ser levados em consideração antes do “fique em casa”. Quando voltei a trabalhar, sabia que estava correndo o risco. Me arrependo? Não. Minha família precisa comer. E esse é o peso da responsabilidade de ser o Chefe da Família.

    Não estou dizendo que sou o único responsável pela minha família ou que eu sou melhor do que minha Esposa. Estou apenas assumindo a consequência de ter prometido a ela, cinco anos atrás, que teríamos um lar. Faria (e farei) tudo de novo.

    Estou ótimo? Não exatamente. Acredito que serão necessários mais alguns meses até que meu corpo esteja completamente são novamente.

    Atualmente, me sinto mais ou menos como o Bilbo Bolseiro descreveu em O Senhor dos Anéis: “(...) estou me sentindo fino, como se eu estivesse esticado, como manteiga que foi espalhada num pedaço muito grande de pão (...)”.

    Para encerrar essa coluna, gostaria agradecer a todos os que torceram e rezaram por mim. Foi uma briga de foice no escuro, mas vocês eram a minha luz. De verdade.

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    “Combater e morrer é pela morte derrotar a morte, mas temer e morrer é fazer-lhe homenagem com um sopro servil.” - William Shakespeare

     

     

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