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    418 Jornal A Bigorna 04/02/2024 20:10:00

    Palanque do Zé

    Os ataques de 11 de Setembro foram a maior ação terrorista já praticada em solo americano, com milhares de mortos, dezenas de bilhões de Dólares em prejuízos financeiros e efeitos que reverberam por todo o planeta desde então, sem previsão de parar de afetar a geopolítica mundial.

    Mas não só, eis que o mesmo episódio também foi uma oportunidade para descobrir se os planos de contingência das empresas da área realmente funcionavam.

    Spoiler: Não funcionavam.

    Mas não pare de ler essa coluna! Você vai saber de muita coisa interessante, como desenvolvimento tecnológico e até trabalho remoto.

    O World Trade Center era formado por sete prédios, abrigando diversas de empresas, a maioria do setor financeiro. Algumas firmas foram basicamente dizimadas, perdendo todos os funcionários. Outras morreram ao perder seus computadores e infraestrutura.

    É claro que, dentre as maiores, a taxa de sobrevivência foi mais frequente. Muito graças a um pânico criado pela mídia: O Bug do Milênio.

    Quando os chefões dessas companhias descobriram que tinham um Departamento de Tecnologia da Informação e que seus computadores poderiam ser afetados com o tal Bug do Milênio, também foram levantadas outras hipóteses e cenários que incluíam, principalmente, desastres naturais.

    Lembre-se de que não era uma época de computação em nuvem, então a maioria das empresas tinham bancos de dados próprios, e um desastre que afetasse escritórios e bancos de dados seria fatal.

    Uma das empresas mais bem-preparadas era a American Express. Isso porque, legalmente, empresas do ramo financeiro nos Estados Unidos precisam de backups, redundância de dados e planos de contingência, mas na maioria dos casos os planos só existiam para agradar o Governo.

     

    No caso da American Express, eles gastaram uma fortuna. A empresa tinha linhas telefônicas e de dados extras, um prédio em Nova Jersey totalmente desabitado, com milhares de baias e computadores nunca usados debaixo daquelas capinhas de plástico inúteis que todos usávamos naquela época.

    Esse tipo de plano de contingência não era muito popular naqueles dias, pois soava muito parecido com o que é defendido por aqueles “malucos” sobrevivencialistas que vivem se planejando para grandes desastres, exatamente como aconteceu em 11 de Setembro de 2001.

    Os planos de evacuação da American Express previam que os funcionários se reuniriam em uma escola próxima, mas ela era muito próxima e o pessoal acabou fugindo em meio à multidão.

     

    ALGUMAS EMPRESAS JÁ ESTAVAM ESCALDADAS:

    Em 1993, um atentado terrorista detonou uma bomba na garagem do World Trade Center. Com o caos que se seguiu, o Morgan Stanley, um megabanco de investimentos levou longas e angustiantes quatro longas horas para evacuar seus 3.800 funcionários. Planos, treinamentos e estratégias foram criados para evitar repetir o fiasco. Em 11 de Setembro, o Morgan Stanley perdeu 13 funcionários, mas os 3.787 sobreviventes foram evacuados em apenas 45 minutos.

    Porém, nem tudo deu certo e alguns planos foram desarranjados pelas circunstâncias.

    A Mastercard tinha um data center e escritórios de backup, mas o data center ficava a 480 KM de distância dos escritórios de backup, o que faz sentido logisticamente hoje em dia, mas não naquela na época, em que nem toda a migração de dados podia ser feita via internet.

    De acordo com o plano, a Firma mandaria uma equipe de avião até o escritório remoto, e eles cuidariam de todos os detalhes para que a ativação do data center reserva ocorresse, com o completo reestabelecimento dos serviços.

    O problema é que todos os voos estavam cancelados em razão da natureza dos atentados terroristas, e a Mastercard teve que mandar seus funcionários de carro.

     

    Enquanto isso, a American Express estava tentando recuperar seus backups. Em 11 de Setembro o serviço de backup era suprido pela EDS, uma das gigantes do setor, que hoje é uma divisão da HP. Mas o trânsito estava completamente parado. A melhor forma de resolver o problema do tempo, foi cada empresa mandar um funcionário de carro, e eles se encontraram no meio do caminho, algo impensável nos dias de hoje, com a computação em nuvem.

    Em posse do backup, um grupo de 30 funcionários da American Express se aglomerou no apartamento do cunhado de um deles, e começou a organizar a situação.

    Eles procuravam por funcionários, ligavam para clientes grandes e filiais em outros países e intermediavam mensagens entre parentes e funcionários que estavam no escritório de emergência em Jersey.

    Lá os funcionários tinham acesso aos sistemas da empresa, dentro do possível. E mais nada. Ninguém havia pensado em instalar televisões ou rádios. Os computadores não tinham navegadores web e o email, que em teoria eles teriam acesso, se comunicava com um servidor em uma das Torres Gêmeas. Ou seja, como o Word Trade Center não existia mais, o tal servidor também não.

    Os funcionários da American Express tinham seus celulares, é claro. Mas ainda era daqueles modelos que só dava para fazer ligações ruins ou jogar o “Jogo da Cobrinha”. É que os smartphones ainda estavam cerca de 6 anos no futuro, e as linhas e antenas estavam totalmente congestionadas. A presença física dos analistas de crédito era fundamental, transações grandes eram (e as grandes mesmo, até hoje ainda são) aprovadas manualmente. E quem está passando um “Cartão American Express Black Ultra Plus” não quer e não pode esperar muito tempo, não é mesmo?

    No final do dia 11 de Setembro, a equipe da American Express conseguiu processar 70% das transações entradas no sistema, o que movimentou US$ 14,3 bilhões, algo notável diante das dificuldades impostas.

    Algumas empresas tinham planos de realocação de pessoal e equipamentos contratados com firmas especializadas, outras tiveram que correr atrás de espaço em prédios da região, o que não era nada fácil de conseguir.

    A Lehman Brothers, que tinha 6.000 funcionários na área e 800 na 1ª Torre, também trabalhou com ótimos planos de contingência, incluindo de evacuação. Tanto que só perderam um funcionário no ataque de 11 de Setembro, mas tiveram que atulhar um monte de gente nos escritórios de backup e Nova Jersey, Manhattan e até em um hotel Sheraton.

    O custo das operações em 11 de Setembro para a Lehman Brothers foi de US$ 127 milhões, com a receita no último trimestre de 2001 caindo 67%. Um dos culpados? Comunicações.

    Com os funcionários e data center no mesmo endereço, uma falha em telecomunicações afeta todos os serviços. Principalmente se eles usam linhas físicas convencionais, ao invés das linhas VOIP, que pode ser facilmente roteada para qualquer terminal do mundo, o que dá extrema agilidade e resiliência em caso de desastres como o de 11 de Setembro.

    No total, além de todo o drama humano, os ataques de 11 de Setembro causaram US$ 83 bilhões em danos à Economia de Nova York, junto com 125 mil empregos perdidos.

     

    AS LIÇÕES APRENDIDAS EM 11 DE SETEMBRO:

    Antes dos ataques, a Mastercard achava que 24h era um bom prazo para reestabelecer seus serviços online, mas depois de 11 de Setembro, em pior cenário, a meta é ter tudo no ar em 2 horas, afinal eles nunca mais querem ter que validar transações de 4 milhões de dólares manualmente!

     

    NENHUM CENÁRIO É DRÁSTICO DEMAIS:

    O Departamento de Prevenção de Desastres se tornou estratégico para as grandes empresas, pois gente “não muito boa da cabeça” se reúne para prever cenários mirabolantes, os quais serão estudados e levados a sério. É assim que pontos de falha são identificados e planos de contingência criados.

     

    TRABALHO REMOTO É UMA POSSIBILIDADE:

    Em 2001, a Internet não era grande coisa, você sabe. Tudo era caro e lento, mas desde então tivemos muitos investimentos em links de alta velocidade e laptops deram mobilidade a funcionários estratégicos, tudo a um preço aceitável. Foi aí que o trabalho remoto passou a ser possível, apesar de ser bastante combatido nas empresas. Com a Pandemia de COVID-19, foi preciso aceitar a realidade do trabalho em casa. Hoje, muitas empresas perceberam que essa modalidade de trabalho traz eficiência, economia e mais paz de espírito aos trabalhadores. Quando alguém ganha, é bom. Mas se todo mundo ganhar, fica melhor ainda!

     

    NÃO FAZ SENTIDO BOTAR TODOS OS OVOS NA MESMA CESTA:

    Ter todos os departamentos da empresa na mesma localização é receita para desastre. Quanto mais pulverizadas as operações forem, melhor. Isso, inclusive, diminui o custo dos escritórios de backup. Com a teleconferência, links rápidos e aplicativos mensageiros como o WhatsApp, Telegram e afins, quase não faz diferença se o sujeito está na sala ao lado ou no outro lado do país.

     

    BACKUP É FUNDAMENTAL:

    Quem lida com transações financeiras segundo a segundo não pode se dar ao luxo de fazer um backup diário. Sistemas tiveram que ser reescritos, estratégias de replicação e buffering de transações foram criados para replicar em bancos de dados remotos as operações locais. Isso foi especialmente complicado na época. Uma linha T3, com 45Mbps de banda podia custar US$ 30 mil por mês. E nem queira saber o custo de uma linha dedicada entre dois data centers separados por centenas de quilômetros.

    Mas hoje tudo ficou melhor e mais barato. Lá no JRF Advocacia, por exemplo, eu tenho 4 cópias do mesmo arquivo: A primeira no computador principal, a segunda no laptop, a terceira na nuvem. Esses são atualizados minuto a minuto. Mas existe ainda a quarta cópia, que é atualizada a cada 30 dias num SSD externo de 2 terabytes, o qual fica armazenado num cofre com acesso limitado a duas pessoas. Em tempos de Inteligência Artificial e Lei Geral de Proteção de Dados, tempo e dados são mais valiosos que ouro. Sem exagero!

     

    PESSOAS SÃO TÃO IMPORTANTES QUANTO TECNOLOGIA:

    Em 11 de Setembro de 2001, uma empresa chamada Cantor Fitzgerald ocupava os andares 101º a 105º da Torre 1 do World Trade Center. O primeiro avião atingiu o prédio alguns andares abaixo. Todos os funcionários que já estavam na empresa, morreram. Dos 960 que trabalhavam na cidade, 658 perderam a vida. Incluindo o irmão de Howard Lutnick, CEO da empresa.

    Howard só não morreu porque estava levando o filho para a escola na hora do ataque.

    Reunindo-se com os sobreviventes em uma conferência naquela noite, ele falou: “Temos duas opções. Podemos fechar a empresa e ir ao funeral de nossos amigos. Lembrem-se de que serão 20 funerais por dia, todos os dias, durante 35 dias consecutivos. E tenho que dizer, não estou realmente interessado em trabalhar. Tudo o que quero fazer é entrar debaixo das cobertas e abraçar minha família. Mas se vamos trabalhar, vamos fazer isso para cuidar da família de nossos amigos. Então, o que vocês querem fazer? Querem fechar a empresa? Ou vocês querem trabalhar mais duro do que vocês já trabalharam antes em suas vidas?”

    Mesmo tendo perdido quase 70% de sua força de trabalho, servidores, arquivos, e tudo o mais, os funcionários conseguiram ressuscitar a Cantor Fitzgerald e, em uma semana, eles estavam operando de novo. Em troca, a Cantor se comprometeu a distribuir 25% dos lucros pelos próximos cinco anos, e pagar por 10 anos o plano de saúde das famílias dos 658 funcionários mortos. No total, foram mais de US$ 180 milhões para as famílias.

    Outras empresas montaram redes de apoio com profissionais de saúde, terapeutas, psicólogos, para atendimento imediato e a longo prazo dos funcionários afetados pelo ataque de 11 de Setembro.

     

    A MELHOR RESPOSTA:

    A melhor resposta ao 11 de Setembro não foi a 2ª Guerra do Golfo, ou a Guerra do Afeganistão, e nem mesmo os vários tiros de calibre 5.56 do fuzil H&K usado pelo Exército Americano, para matar Osama Bin Laden.

    A melhor resposta a um ataque direto aos Estados Unidos e ao famoso Sonho Americano, na verdade, foi não se curvar, não ceder e não mudar, como Osama queria!

     

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