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    Suicídios de PMs crescem em SP e colocam Comando em alerta para saúde mental

    1183 Jornal A Bigorna 17/04/2022 17:00:00

    O grande número de policiais militares que tiraram a própria vida nos últimos anos ligou o sinal de alerta da cúpula da Polícia Militar de São Paulo. A corporação lançou um manual de prevenção às manifestações suicidas para os seus agentes. Só em 2021, foram 34 suicídios no estado, o que dá uma média de um caso a cada 11 dias.

    Entre 2015 e 2020, 137 policiais militares que estavam na ativa cometeram suicídio, de acordo com o Comando da corporação, o que gera média de 22,8 ocorrências por ano. Outros 4.729 foram afastados por causa de problemas psicológicos no mesmo período. Hoje a Polícia Militar tem 176 PMs afastados pela psiquiatria.

    No Brasil como um todo, são mais de 11 mil casos de suicídio por ano, segundo dados do Ministério da Saúde. A taxa nacional em 2018 foi de 6,3 por 100 mil habitantes. De acordo com relatório da Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo, na PM, no biênio 2017/2018 a média foi de 21,7 por ano, entre 83 mil policiais. Com os ajustes necessários para fazer a comparação, a taxa de suicídios entre PMs se mostra mais de 4 vezes maior do que a nacional.

    O aumento dos casos de suicídio entre os agentes contrasta com a diminuição no número de PMs mortos durante a folga e em serviço no ano passado.

    A cartilha conta com 38 páginas. Ela teve a coordenação do major Mario Kitswa, que também é psicólogo e que está há 27 anos na corporação. O lançamento foi em abril de 2021, mas a entrega física será feita neste ano. Há atualização na versão, já que foi instituído um novo Núcleo de Apoio Psicológico nesse período. Na versão deve constar um número de WhatsApp para o contato com a clínica psicológica.

    Segundo o major, o suicídio é entendido como um fenômeno complexo, multifatorial, multicausal. Uma série de circunstâncias estão envolvidas nesse fenômeno. A ideia do manual é orientar os policiais sobre como identificar quando um colega precisa de ajuda e como agir ao se deparar com conversas suicidas.

    "Esse manual, assim como campanhas que nós fazemos, com palestras, para a introdução desses assuntos no fluxo de informação, tem como condão servir como orientação. A ideia é relativamente simples, mas com as indicações dos principais fatores de risco, de proteção, e algumas orientações básicas para quando o policial militar fizer a leitura entender um pouco mais a forma de abordar alguém em uma condição como essa", diz o major.

    Para a socióloga Dayse Miranda, doutora em ciência política e professora e pesquisadora do Ippes (Instituto de Pesquisa, Prevenção e Estudos em Suicídio), a atitude da PM de São Paulo é "louvável" para promover informações relevantes, independentemente de a pessoa estar em risco ou não. Porém ainda é preciso mais.

    "É uma ação importante na conscientização do problema, mas não é suficiente. É preciso ir além, como por exemplo avaliar o trabalho que a Polícia Militar desenvolve há mais de 20 anos com o programa de prevenção de manifestação suicida. Até hoje não foi feito nenhum tipo de avaliação, não sabemos de fato se funciona", diz Dayse.

    O governo paulista criou, em 2001, o Sismen (Sistema de Saúde Mental da Polícia Militar do Estado de SP). Segundo Kitswa, esse sistema começa a atuar no processo seletivo, antes mesmo de o indivíduo entrar na corporação.

    "Temos uma etapa dentro do concurso público que são os exames psicológicos. Lá não se pretende ver doença, ou verificar alguma psicopatologia, mas entender o perfil daquela pessoa, se corresponde às exigências dessa pressão."

    De acordo com Kitswa, "o sistema é abrangente. Quando se fala em prevenção do suicídio, de manifestações suicidas, é importante que todas as atividades funcionem bem, para que lá na frente a gente tenha um melhor resultado possível."

    Para Rafael Alcadipani, professor da FGV (Fundação Getulio Vargas) e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a saúde mental dos policiais é um problema gravíssimo.

    "É um dos problemas mais graves da segurança pública hoje a saúde mental dos policiais. Temos números expressivos de suicídios de policiais e também números expressivos de policiais que cometem atos de violência contra suas parceiras ou seus parceiros", diz o professor.

    "O que temos são cartilhas que ainda são fúteis diante do desafio do problema. Precisa de uma mudança inteira na PM, tanto na lógica de gerir seus policiais quanto na lógica de formar seus gestores."

    Fernanda Cruz, do Núcleo de Estudos da Violência da USP, vê o manual da PM paulista como uma iniciativa no sentido de sensibilização, mas não deve ser a única. Segundo ela, é preciso promover medidas para que os policiais consigam fortalecer outros laços.

    "Sem dúvida uma assistência de saúde mental é fundamental, mas não é o único aspecto que promove saúde para o trabalhador. Precisa ter condições salariais razoáveis, sem que precise fazer um trabalho de hora extra, que coloca mais em risco a vida dele. Precisa ter uma escala de trabalho razoável para que possa dormir, ter uma convivência com a família."

    A pesquisadora também vê o consumo de álcool e entorpecentes como fator que pesa na saúde mental de PMs, o que, segundo ela, não é algo tratado da forma que deveria ser.

    "Esse é um assunto mais tabu que o suicídio. É mais difícil assumir que o policial usa drogas, usa álcool de forma abusiva. Ele se apresenta como guardião da sociedade, então isso o coloca em uma situação de muita vulnerabilidade. É difícil as instituições assumirem esse problema e se comprometerem a buscar soluções para ele”. (Da Folha de SP)

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