• Não é a convicção religiosa que te faz solidário, é a empatia

    1537 Jornal A Bigorna 20/12/2020 22:30:00

    Eu vejo uma criança vendendo balas num semáforo. Ela me pede que eu compre um pacotinho das suas balas. Eu e a criança – dois corpos separados e distintos. Mas, ao olhar para ela, estremeço: algo em mim me faz imaginar aquilo que ela está sentindo. E então, por uma magia inexplicável, esse sentimento imaginado se aloja junto dos meus próprios sentimentos.

    Na verdade, desaloja meus sentimentos, pois vinha, no meu carro, com sentimentos leves e alegres, e agora esse novo sentimento se coloca no lugar deles. O que sinto não são meus sentimentos. Foram-se a leveza e a alegria que me faziam cantar. Agora, são os sentimentos daquele menino que estão dentro de mim. Meu corpo sofre uma transformação: ele não é mais limitado pela pele que o cobre. Expande-se. Ele está agora ligado a outro corpo que passa a ser parte dele mesmo.

    Isso não acontece nem por decisão racional, nem por convicção religiosa, nem por um mandamento ético. É o jeito natural de ser do meu próprio corpo, movido pela solidariedade. Acho que esse é o sentido do dito de Jesus de que temos de amar o próximo como amamos a nós mesmos. A solidariedade é a forma visível do amor. Pela magia do sentimento de solidariedade, meu corpo passa a ser morada do outro. É assim que acontece a bondade, por intermédio da empatia, da capacidade de se colocar no lugar do outro. […]“O menino me olhou com olhos suplicantes. E, de repente, eu era um menino que olhava com os suplicantes…”.

     

    Trecho de “Assim acontece a bondade” – Crônica de Rubem Alves.

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