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    O retorno de Valdemar Costa Neto e seu partido, o PL, ao governo de Bolsonaro

    1615 Jornal A Bigorna 04/04/2021 12:50:00

    No dia 2 de março, o então ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, recebeu em seu gabinete o líder do PL na Câmara, Wellington Roberto (PB). Ao longo de uma hora, o deputado, visivelmente irritado, fez uma série de reclamações sobre a atenção que o partido vinha recebendo do Planalto — ou, melhor dizendo, a falta dela. As queixas envolviam desde indicações para cargos de segundo e terceiro escalões que não se concretizavam até a necessidade de ocupação de espaços mais nobres no organograma da administração federal. A conversa teve um momento memorável. O presidente da Conab, a Companhia Nacional de Abastecimento, havia morrido de Covid-19 naquele mesmo dia. O órgão estava na área de influência do Republicanos, outro partido da base aliada. Sem nenhuma cerimônia, o deputado disse que o PL já tinha um candidato para substituir o morto. Na segunda-feira passada, ao anunciar a reforma ministerial, Jair Bolsonaro não só atendeu às reivindicações do partido como sacramentou o resgate do presidente da legenda, o notório Valdemar Costa Neto, que, depois de um período sabático, está de volta.

    Ícone de um dos mais rumorosos casos de corrupção política, o ex-deputado Costa Neto faz parte daquele grupo de parlamentares com excepcional habilidade para se manter na órbita do poder. No governo Lula, participou da costura da aliança entre o PL e o PT. No Congresso, foi um dos artífices da ampla base de apoio ao presidente petista. Em troca, ele e seu partido ganharam o controle de nacos importantes da administração federal. O resultado dessa parceria ficou conhecido como o escândalo do mensalão, que resultou na renúncia do então deputado e na condenação a sete anos de cadeia. Mesmo preso, Valdemar nunca abriu mão de controlar o partido. No governo Dilma, em troca de apoio político, continuou dando as cartas no Ministério dos Transportes, a raiz de um novo e barulhento escândalo de corrupção. Na Lava-Jato, foi acusado por um empreiteiro de cobrar propina para “abrir portas” em Brasília. No ano passado, virou réu por peculato, corrupção passiva e fraude em licitação, acusado de participar de um esquema de desvio de dinheiro nas obras da Ferrovia Norte-Sul. Diante de tantas realizações e com a polícia de novo em seu encalço, o ex-parlamentar hibernou por um bom tempo.

    O retorno ao centro do palco começou aos poucos, ainda durante a campanha presidencial, em 2018. O PL era uma das alternativas consideradas por Bolsonaro para se lançar candidato. Na época, ele e seus auxiliares se reuniram com Valdemar pelo menos quatro vezes, mas as negociações não avançaram porque o ex-capitão condicionava seu ingresso no partido ao controle total dos diretórios, prerrogativa que o ex-deputado resistiu em aceitar. Em abril do ano passado, diante da aproximação do governo com o Centrão, Valdemar, de maneira discreta, mas ativo nas negociações, foi conquistando espaço dentro e fora do Palácio. Em um sinal de poder, no fim de 2020, ele reassumiu formalmente a presidência do PL, função da qual ele havia se afastado desde que foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro.

    No governo Bolsonaro, o PL está à frente de duas diretorias do FNDE, uma secretaria no Ministério da Saúde, outra no Ministério do Turismo, além da cobiçada presidência do Banco do Nordeste — na campanha de 2018, vale lembrar, o então candidato a presidente da República jurava que jamais entregaria um banco estatal a um partido político. São outros tempos. Atualmente, esses cargos não são apenas ocupados por nomes indicados pelos grandes caciques como tomados para si. Exemplo disso foi uma queda de braço travada recentemente entre o secretário-executivo do Ministério da Educação, Victor Veiga, e um subalterno indicado pelo PL. Certo dia, Veiga procurou o diretor de Tecnologia e Inovação do FNDE, Paulo Roberto Ramalho, para lhe informar que iria promover uma substituição em sua área. Logo depois do anúncio, o deputado Wellington Roberto, aquele do início da reportagem, prometeu resolver o impasse. Braço direito de Valdemar Costa Neto, ele, de fato, resolveu. O secretário-executivo foi desautorizado e o insubordinado diretor de Tecnologia nem sequer foi admoestado.

    Mais alguns dias depois, esse mesmo diretor de Tecnologia protagonizou um “quase” escândalo ao liberar, sem ter autorização nem prerrogativa formal para isso, 150 milhões de reais para uma faculdade privada de São Paulo. O negócio só não se concretizou porque a auditora do Tesouro Nacional Renata D’Aguiar denunciou ao presidente do FNDE que Ramalho, oficialmente responsável por assuntos relacionados a computadores e redes de internet, cruzou a sua competência para favorecer o repasse milionário à faculdade paulista Uniesp. O dinheiro ia ser liberado, disse Renata a VEJA, mesmo diante da constatação de várias irregularidades e de inconsistências em documentos que impediam o repasse. “O Paulo dizia aos quatro ventos no FNDE que o Valdemar era o chefe dele, e essa Uniesp tem um monte de rolo”, informa a auditora. O pagamento, dessa vez, foi interceptado a tempo.

    Antes de o presidente Bolsonaro decidir entregar a Secretaria de Governo à deputada Flávia Arruda (PL-DF), o partido, que tem 41 parlamentares, reclamava de que aliados menos relevantes estavam sendo privilegiados com os postos mais importantes na administração federal. Por isso, para compensar, havia a pressão para que a Conab — órgão que tem um orçamento de 2 bilhões de reais e forte atuação no setor agrícola — ficasse sob os cuidados de alguém indicado pela legenda. Com a ascensão da deputada, que também é muito próxima ao presidente do partido, isso não deve mais ser um problema. A pasta da nova ministra é responsável pela articulação política, o que inclui o controle e a distribuição de todos os cargos, cerca de 13 000. O PL e Valdemar Costa Neto estão definitivamente de volta ao jogo — como nos velhos tempos.(DA Veja)

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