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    PCC banca há 20 anos o Expresso 1533 para parentes visitarem presos, diz MP

    940 Jornal A Bigorna 31/01/2024 16:40:00

    Os ônibus são chamados de "Expresso 1533", segundo apuração da reportagem. Os números se referem às posições no alfabeto das letras da sigla PCC — o 15 corresponde ao P, e o 3, ao C.

    O MP-SP (Ministério Público do Estado de São Paulo) investiga uma célula do PCC chamada de "setor dos ônibus", responsável por bancar o transporte de familiares de presos para penitenciárias do interior paulista, nos fins de semana, quando os encarcerados recebem visitas.

    Documentos do MP-SP e do TJ-SP (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo) mostram um resumo da estrutura e um organograma do PCC com a divisão das células que compõem os diversos setores da facção criminosa. Um deles é o dos ônibus.

    A documentação indica que o PCC, há pelo menos duas décadas, banca as despesas com os ônibus fretados para transportar parentes de presos a dezenas de cidades do interior paulista.

    Os ônibus são chamados de "Expresso 1533", segundo apuração da reportagem. Os números se referem às posições no alfabeto das letras da sigla PCC — o 15 corresponde ao P, e o 3, ao C.

    Laranjas dificultam apuração

    O MP-SP tenta identificar qual ou quais integrantes do PCC são os chefes do setor dos ônibus. A investigação é considerada difícil porque o frete dos veículos e a aquisição de outros ônibus da própria facção são feitos em nome de "laranjas".

    Até agora, o que se sabe é que as diversas células do setor de ajuda do PCC foram criadas pela liderança do grupo em 2002 e aperfeiçoadas até o ano de 2006 na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau.

    Segundo o Tribunal de Justiça, era daquele presídio que a "liderança delegava poderes e autonomia" aos integrantes da facção em liberdade para que cumprissem "todas as metas impostas pela cúpula reclusa".

    A Polícia Civil apurou que o esquema do transporte de parentes de presos passou a funcionar em dezembro de 2001. Foi o início do processo de desativação da Casa de Detenção, no Carandiru, zona norte de São Paulo, considerada à época o maior presídio da América do Sul.

    A unidade prisional tinha capacidade para 3 mil presos, mas abrigava em torno de 7 mil. A desativação da Detenção, palco do massacre de 111 presos em 2  de outubro de 1992, foi uma promessa do então governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB).

    As transferências dos presos para o interior ocorreram gradativamente. O último "bonde" (remoção) aconteceu em 15 de setembro de 2002 — eram 76 detentos. Quase três meses depois, em 8 de dezembro, a Casa de Detenção foi implodida. "E sem deixar saudades", disse Alckmin.

    Sociólogos e estudiosos do crime organizado argumentam que a implosão do presídio ajudou a fortalecer ainda mais o PCC. A maioria dos parentes de presos removidos para bem longe do vínculo familiar não tem dinheiro para pagar as despesas todas as semanas. As passagens para a região oeste do estado, distante 600 km da capital, não são baratas.

    Um bilhete de ida e volta para Mirandópolis, por exemplo — a 595 km de São Paulo —, onde estão duas unidades prisionais lotadas de presos ligados aoPCC, sai em torno de R$ 580. Se o preso recebe a visita da mulher e da mãe, por exemplo, esse custo semanal ultrapassa a casa de R$ 1 mil.

    Serviço a bordo é gratuito

    Desde a desativação da Casa de Detenção, dezenas de ônibus partem às sextas-feiras e aos sábados da avenida Cruzeiro do Sul, no Carandiru, endereço do extinto presídio, e da Barra Funda, na zona oeste, para diversas cidades do interior paulista. Há ainda coletivos que saem do Vale do Paraíba e Baixada Santista.

    Até poucos anos atrás, familiares de presos moradores de Santos que fazem visita nas Penitenciárias 1 e 2 de Presidente Venceslau, no interior, pegavam uma van até a capital e embarcavam no ônibus na avenida Cruzeiro do Sul. Agora tem uma linha direta do "Expresso 1533" que sai do município litorâneo.

    Segundo pessoas que usufruem do serviço, os ônibus são novos e confortáveis e incluem serviço de bordo, com água, café, refrigerantes e lanches. Tem até wifi. Tudo é grátis para os familiares. Outras linhas do "Expresso 1533" para Avaré e outras cidades do oeste paulista também oferecem as bebidas e refeições.

    Os gastos do PCC com o "Expresso 1533" e outras despesas, como cestas básicas, rifas com sorteios de prêmios para faccionados e até contratação de advogados, são investigados até hoje pela Polícia Civil em diversos inquéritos por crimes de tráfico de drogas, associação criminosa e lavagem de dinheiro.

    Um dos inquéritos, que apurava a morte do juiz Antonio José Machado Dias, o Machadinho, morto a tiros em 14 de março de 2003 em Presidente Prudente, a mando do PCC, chegou a um grupo responsável na época pelos fretes dos ônibus com destino a Presidente Venceslau e Avaré. Os suspeitos foram presos e condenados.

    O "assistencialismo" do PCC, com a criação das diversas células do setor de ajuda, proporcionou à facção um grande número de adeptos entre a massa carcerária. Milhares de detentos se filiaram à organização por esses motivos, e quem não ingressou nas fileiras da facção passou a ser simpatizante do grupo.

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