“A autoridade institucional, por sua natureza, não tolera a inação ou a vulnerabilidade estrutural”. Essa é a forma mais pomposa de se dizer que “não existe vácuo de poder”. O meu amigo e Ex-Prefeito de Avaré, Rogélio Barchetti Urrea foi quem me ensinou isso, nos idos de 2002.
O Ministro Gilmar Mendes, ao declarar que ele e os colegas de Corte fizeram “tudo dentro da legalidade”, sugere a inexistência de fundamentos para um processo de impeachment. A frase é infeliz por três motivos principais:
- Não compete a ele, julgar tais processos. Referida função é constitucionalmente exclusiva do Senado;
- De maneira generalista, o Decano do Supremo considerou que, os mais de 80 pedidos de impedimento protocolados no Senado Federal seriam caracterizados como meros atos de abuso ou retaliação política, o que não se admite no Ordenamento Jurídico Nacional e,
- Juízes não se manifestam fora dos autos.
Esta perspectiva resume de forma eloquente a dinâmica recente da República brasileira, na qual a própria Corte Suprema se estabelece como a derradeira instância de autocontrole.
Questiona-se, neste cenário, a relevância e a eficácia do controle externo. A menção a “impeachments abusivos” e “retaliação política” pode ser interpretada como uma antecipação a uma possível alteração na composição do Senado, que poderia, por via democrática, exercer um controle mais rigoroso sobre o Supremo Tribunal Federal (STF), incluindo a abertura de processos de impedimento.
Parece que se busca, preventivamente, readequar as regras do jogo para mitigar futuras inconveniências. Afinal, vai que os “bolsonaristas” conseguem a maioria das cadeiras no Senado Federal e tenham o poder de iniciar um impeachment contra ministros que há muito tempo, diga-se de passagem, estão dando motivos para serem expurgados da Suprema Corte? É preciso mudar as regras do jogo para impedir isso!
A Decisão em questão transcende a mera interpretação da Lei do Impeachment (Lei nº 1.079/1950). Ela impacta diretamente a Constituição Federal de 1988, que confere ao Senado a competência privativa para “processar e julgar” os Ministros do STF (art. 52, I e II).
Se a nova diretriz prevalecer, a iniciativa para um eventual processo ficaria condicionada à atuação da Procuradoria-Geral da República (PGR), que passaria a funcionar como um filtro prévio e obrigatório ao próprio Senado. Na prática, o exercício da prerrogativa constitucional do Senado ficaria subordinado à discricionariedade da PGR, e um simples Despacho monocrático terá mudado a Constituição Federal de 1988, ferindo de morte o Princípio Constitucional da Hierarquia das Normas.
Isso configura uma espécie de competência compartilhada que jamais foi prevista pelo constituinte originário. O que se observa é a manifestação de um Ministro que, por meio de uma interpretação teratológica, promove um “ajuste” em um comando constitucional explícito, subtraindo não apenas uma prerrogativa da cidadania, mas uma competência inerente à Casa Alta do Poder Legislativo.
O aspecto mais grave reside no fato de que o órgão submetido ao controle define os limites desse mesmo controle. Tal inversão contraria frontalmente o Sistema de Freios e Contrapesos, princípio basilar que estrutura o regime republicano e visa garantir a harmonia e a independência entre os Poderes.
Este avanço institucional não é um fenômeno isolado. Ele é o resultado de um processo gradual. Quando o STF instaurou o polêmico Inquérito das Fake News (INQ 4781) em 2019, agindo por iniciativa própria e sem base legal clara à época, a maioria das vozes silenciou, afinal, “era preciso derrotar o bolsonarismo”. O mesmo ocorreu diante da prática de censura prévia e da condução de julgamentos de cidadãos sem foro por prerrogativa de função, em clara dissonância com o ordenamento jurídico vigente. À época, a grande mídia disse que “era preciso defender a Democracia”.
Agora, resta claro que a inércia e o silêncio da maioria, justificados por conveniências políticas momentâneas ou pela crença na fragilidade das instituições brasileiras, pavimentaram o caminho para a situação atual. Sob essa ótica, a postura do Ministro Gilmar Mendes se torna compreensível. O poder, de fato, não admite o vácuo.
Se o Senado, até o presente momento, se absteve de exercer seu papel fiscalizador, por que o faria agora? O Supremo avança sobre as competências dos demais Poderes, assim como o fez em relação a direitos individuais, impulsionado por uma lógica política elementar: Porque pode.
Essa capacidade de avanço é sustentada pela percepção de que as instituições nacionais são frágeis, pela minimização do problema por parte de lideranças políticas (como a que reduz a questão a uma mera “polarização política”), pelo silêncio de grande parte do meio jurídico (que depende da Corte) e, inegavelmente, pelo clima de temor que se instalou no Brasil.
É preciso deixar claro que estamos vivendo uma ditadura da toga, onde alguns juízes - das três instâncias – mas em especial do Supremo Tribunal Federal, deixaram de subordinar-se ao império da lei, para fazer politica e reescrever a história.
Recentemente, li no Estadão, um artigo sobre ter sido necessário que o STF extrapolasse suas atribuições, para combater o bolsonarismo e defender a democracia, mas que agora que tais metas foram alcançadas, a Corte precisaria deixar o protagonismo e retomar a normalidade institucional.
Penso que, quem escreve uma coisa dessas, é inocente demais, por tantos motivos, que daria para escrever outra coluna. A verdade é uma só: Uma vez solto, o Gênio não voltará à lâmpada. Hoje, o alvo é a Direita. Amanhã, será a Esquerda.
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