
Agora já é tarde.
Só reparo o tempo quando já passou.
Sou um cego que vê
muitas portas.
Abro aquela que está mais perto.
Não escolho,
tropeço a mão no
fecho.
Minha vida não é um caminho.
É uma pedra fechada
à espera de ser areia.
Vou entrando nos grãos do chão,
devagarinho.
Quando me quiserem
enterrar já eu serei terra.
Já que não tive vantagem na vida,
esse será o privilégio da minha morte.
Mia Couto, em "Vozes Anoitecidas"