
O julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete acusados de tramarem contra a democracia terminou com a justa e legítima condenação dos réus. Houve, porém, exageros no tamanho das penas e se espera razoabilidade na definição do regime em que as prisões serão cumpridas.
Não há razão para regozijo com o desfecho desse processo judicial. Quando um regime, para se defender da tirania, tem de ativar remédios drásticos como o encarceramento de líderes políticos e militares, falharam todos os mecanismos preventivos.
A alta probabilidade de a aventura terminar na cadeia deveria ter bastado para dissuadir da conspiração seja Bolsonaro, sejam os ex-ministros Walter Braga Netto, Augusto Heleno, Anderson Torres, Paulo Sérgio Nogueira, o ex-chefe da Marinha Almir Garnier e os ex-auxiliares Mauro Cid e Alexandre Ramagem.
Houve aspectos criticáveis no juízo. Teria sido melhor submeter ao plenário dos 11 integrantes da corte, não à turma de 5, a primeira acusação de um ex-presidente por tentativa de golpe na conturbada história republicana.
Exagerou-se também na dose do castigo. É difícil explicar à população por que o STF determinou 27 anos e três meses de prisão ao ex-presidente, sentença maior que muitas aplicadas a homicidas. Essa anomalia já havia ocorrido nas penas dos depredadores da praça dos Três Poderes.
Há caminhos constitucionais para sanar esse desequilíbrio, quer pela revisão do próprio STF —com base na premissa de que abolição do Estado de Direito e golpe são na prática um mesmo crime, e não dois—, quer pela aprovação de uma lei no Congresso Nacional que desfaça essa sobreposição.
Outros estranhamentos podem ter surgido no processo, como o de ver o advogado pessoal do atual presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e um de seus mais fiéis ex-ministros na banca dos julgadores. As heterodoxias e os arroubos do relator, Alexandre de Moraes, tampouco são ocorrências de se admirar.
Mas nada disso —é importante frisar— retira a legitimidade do que foi decidido nesta quinta-feira (11). O Estado de Direito se consuma na observância de suas regras, e elas foram todas cumpridas, com margens para interpretações diversas cabíveis.
Não se deve tirar o foco do essencial —a tentativa, da parte de um grupo vencido nas urnas, de manter-se no poder à força. A iniciativa criminosa partiu de Bolsonaro e seguidores. O sistema de Justiça apenas reagiu ao agravo dentro de sua competência.
Como o objetivo não é a vingança, mas a punição proporcional ao crime para evitar que ele volte a ocorrer, a corte deveria ouvir com atenção os argumentos da defesa de Bolsonaro para que ele cumpra a pena em domicílio.
Não há dúvidas sobre tratar-se de condenado com saúde comprometida em virtude do atentado sofrido na campanha de 2018. Submetê-lo nessas condições ao presídio comum seria desumano.(Da Folha de SP)