• O presentão de Moraes a Bolsonaro

    103 Jornal A Bigorna 04/08/2025 20:40:00

    O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes decretou a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro em caráter preventivo. Além disso, Moraes determinou a apreensão de todos os celulares em poder do ex-presidente por considerar que ele teria violado as medidas cautelares impostas pela Primeira Turma ao participar remotamente das manifestações pela anistia aos golpistas ocorridas ontem. Bolsonaro foi ouvido por seus apoiadores em Copacabana, zona sul do Rio, por intermédio de seu filho mais velho, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que publicou o conteúdo das mensagens em suas redes sociais e depois apagou, decerto ciente do risco que isso envolvia.

    A ordem de Moraes é decorrência direta de uma grosseira confusão, é forçoso dizer, criada pelo próprio ministro. Prender Bolsonaro em casa é um desafio à compreensão lógica dos fatos e, a rigor, uma afronta ao propósito das medidas cautelares ordenadas por ele mesmo. Em primeiro lugar, Bolsonaro não deveria ter sido privado de usar as redes sociais, o que significa, na prática, censurá-lo previamente. Como já dissemos nesta página, o ex-presidente fez por onde merecer o uso de tornozeleira eletrônica e a restrição de circulação. Contudo, a proibição de uso das redes sociais foi um claro exagero de Moraes, ao fim referendado pela maioria de seus pares na Primeira Turma.

    Para piorar, os termos dessa proibição eram tão vagos e confusos – Moraes vedou a “instrumentalização de entrevistas ou discursos públicos como ‘material pré-fabricado’ para posterior postagem nas redes sociais de terceiros previamente coordenados” – que é lícito inferir que a intenção do ministro ao redigi-los de forma intrincada, considerando que não se trata de alguém que não domine o vernáculo, era manter Bolsonaro sob um controle abusivo de sua palavra. Dessa madeira torta não haveria de brotar galho reto.

    Em sua decisão, Moraes afirmou que, “agindo ilicitamente, o réu Jair Messias Bolsonaro se dirigiu aos manifestantes reunidos em Copacabana, no Rio de Janeiro, produzindo dolosa e conscientemente material pré-fabricado para seus partidários continuarem a tentar coagir o STF e obstruir a Justiça, tanto que o telefonema com seu filho Flávio Nantes Bolsonaro foi publicado na plataforma Instagram”.

    Por mais descabida que seja, a vedação de uso das redes sociais imposta a Bolsonaro foi uma decisão juridicamente válida que, por óbvio, tinha de ser cumprida pelo réu. Se não foi, Moraes deveria ter mandado Bolsonaro para a cadeia, não ordenado seu confinamento domiciliar – até porque foi de casa que o ex-presidente violou a ordem inicial. Isso não faz sentido algum, o que autoriza a suspeita de que o regime de prisão escolhido pelo ministro neste momento faça parte de um cálculo político.

    Ao fim e ao cabo, Moraes deu um presente a Bolsonaro. Com a bagunça que ele mesmo fez, o ministro ajudou o ex-presidente a espalhar o discurso de que seria um “perseguido” pela Justiça. Isso em nada contribui, muito ao contrário, para o esforço monumental que o Supremo tem de fazer para reverter a percepção de uma parcela expressiva da sociedade brasileira de que o julgamento do ex-presidente não é técnico nem muito menos imparcial.

    Ora, é evidente que Bolsonaro tem reiteradamente desafiado as instituições democráticas. Inclusive, é réu no STF justamente por isso, razão pela qual à Corte cabe agir com redobrada prudência. Tumultos ocasionados por seus próprios ministros, ainda mais atingindo uma figura sabidamente nociva à ordem democrática como o ex-presidente, contribuem para corroer a autoridade do Supremo. Um ato arbitrário não deixa de ser arbítrio quando praticado contra quem traz o autoritarismo na alma.

    Toda essa confusão gerada por Moraes, sobretudo ao aplicar uma sanção por suposta violação de regras mal redigidas por ele mesmo, entregou ao ex-presidente justamente o que ele mais busca: oportunidades de posar como mártir. Agindo assim, Moraes conspurca a autoridade do STF. Oxalá não tenha comprometido a responsabilização legítima de Bolsonaro por ter se envolvido até a medula numa tentativa de golpe de Estado.(Do Estado de SP)

    OUTRAS NOTÍCIAS

    veja também